As dificuldades de acesso ao crédito afetam os grupos sociais de maneiras distintas. Este artigo discute como a visibilidade para crédito pode impactar a democratização dos serviços financeiros e reduzir essas diferenças, promovendo o desenvolvimento econômico e social.
A ampla base de dados do Global Findex, disponibilizada pelo Banco Mundial, possibilita uma primeira avaliação sobre o grau da relação entre desigualdade de renda e inclusão financeira. No caso brasileiro, observa-se que a diferença entre o acesso à conta bancária dos 60% mais ricos e dos 40% mais pobres diminuiu ao longo dos últimos anos. Em 2011, 68% dos mais ricos eram bancarizados. Já entre os mais pobres, esse percentual era de 37,5%, resultando em uma diferença de 31 pontos percentuais.
O quadro de 2021 mostra que a bancarização continuou crescendo nos dois grupos. E apesar de ainda haver uma expressiva diferença, constata-se uma redução do gap: o percentual de bancarizados subiu para 85% entre os mais ricos e para 82% entre os mais pobres. Na média mundial, também se observa uma redução da diferença de acesso à conta bancária entre esses grupos, conforme mostra o gráfico abaixo.
No Brasil, o primeiro ano de pandemia, que concentrou o esforço para bancarizar os trabalhadores informais, teve repercussão positiva sobre a evolução do acesso à conta bancária nas faixas de menor renda. Embora o avanço da bancarização seja benéfico, cabe uma ressalva já feita neste espaço. O acesso à conta bancária é um indicador importante, acompanhado no mundo inteiro, no entanto a inclusão financeira vai além disso.
Na definição do Banco Central, a inclusão financeira caracteriza-se pelo acesso efetivo a crédito, poupança, pagamentos, seguros, previdência e investimentos. Nesse sentido, o acesso à conta bancária representa apenas a porta de entrada para a inclusão efetiva. O “Financial Inclusion Report” 2021/22, divulgado pelo governo britânico, apresenta os números sobre a abertura de contas básicas – um tipo específico de conta corrente voltado para os consumidores com dificuldade de acesso às contas correntes pessoais – e destaca que esse é só o primeiro passo para o acesso ao crédito.
A visibilidade é fundamental para ampliar o acesso dos consumidores ao mercado de crédito, seja através de instituições financeiras ou de outros credores, como o varejo e fornecedores de serviços. O consumidor recém-bancarizado precisaria construir um histórico de transações com o sistema financeiro antes de pleitear limites de crédito mais elevados, por exemplo. A visibilidade para crédito garante que as instituições concedentes de crédito tenham informações sobre o tomador de crédito e possam avaliar esse tipo de demanda, independentemente do relacionamento prévio, baseando-se no histórico financeiro que o consumidor construiu com outros setores da economia, como o setor de utilidades públicas. O uso dessas informações é valioso para a análise do comportamento do tomador d crédito e decidir se aprova uma operação e quais parâmetros de prazo e juros são mais condizentes com o perfil de risco do cliente.
Essa visibilidade beneficia consumidores de todos os perfis de renda e empresas de todos os portes. Para quem já era incluído financeiramente, o aumento da precisão da análise de crédito a partir do uso de um leque maior de informações significa condições de crédito mais justas e adequadas. Espera-se, no entanto, que os benefícios sejam mais fortes para aqueles que sempre estiveram à margem do sistema financeiro e que estão saindo praticamente do “zero” em termos de informações de crédito.
A discussão sobre as desigualdades de acesso a serviços financeiros e renda está intimamente ligada ao desenvolvimento. A literatura recente avançou sobre o entendimento de como essas diferenças afetam negativamente o crescimento econômico, uma vez que a falta de acesso ao crédito inibe o acesso a recursos financeiros aos indivíduos seja para consumo assim como para o empreendendorismo junto à população de menor poder aquisitivo.
Nos últimos anos, o Brasil deu passos importantes na direção da visibilidade para crédito através dos bureaus de crédito e criou condições para transformar a chegada de milhões de consumidores ao sistema financeiro em uma inclusão efetiva e positiva para a economia. Essa visibilidade também será fundamental para permitir a expansão segura e mais inclusiva do crédito, com efeitos positivos sobre o bem-estar e a produtividade.
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Por: Elias Sfeir Presidente da ANBC & Membro do Conselho Climático da Cidade de São Paulo & Conselheiro Certificado