O mercado de crédito promove o encontro entre os agentes econômicos superavitários, isto é, com sobra de recursos, e os agentes deficitários, que demandam mais recursos do que dispõem. Em geral, os demandantes de recursos buscam antecipar consumo a fim de ampliar seu bem-estar ou realizar investimentos produtivos com a promessa de um retorno futuro.
O bom funcionamento do mercado de crédito torna essas transferências de recursos mais eficientes, menos arriscadas e impulsionam a economia. Tudo isso depende, é claro, da qualidade do regramento desse mercado. Uma das premissas para que o mercado de crédito exerça bem o seu papel é a gestão de riscos. Há o risco de inadimplência, mitigado pelos instrumentos de análise de crédito, e o risco de utilização desse mercado para fins ilícitos, mitigado pelas políticas de governança e, cada vez mais, pela tecnologia.
A gestão de riscos reúne órgãos supervisores do sistema financeiro e soluções de mercado. A atuação de décadas dos birôs de crédito é um exemplo de solução que busca controlar esses riscos O surgimento dos bancos de dados administrados pelos primeiros birôs remonta aos anos 50, quando o Sistema Financeira Nacional ainda estava nascendo, os bancos tinham uma atuação limitada e a atividade comercial tinha um papel fundamental nos financiamentos. Só na década seguinte surgiria o Banco Central do Brasil.
Desde então, muita coisa mudou. Os bancos de dados dos birôs, inicialmente focados nos registros de inadimplência, ganharam abrangência nacional e foram beneficiados pelo avanço da tecnologia da informação. As soluções do setor incorporaram, para além da análise de crédito, a prevenção à fraude, recuperação de crédito e prospecção de clientes.
O Sistema Financeiro Nacional (SFN) foi se modernizando e tornando-se mais complexo. Hoje, o SFN abriga três tipos de operadores de crédito: os bancos, as cooperativas e as instituições não bancárias. Comecemos pelos bancos: a atividade bancária é variada e engloba bancos comerciais, bancos de desenvolvimento, bancos de investimento, além da Caixa Econômica Federal e do BNDES. Os bancos comerciais têm uma atuação mais abrangente e são autorizados a captar depósitos à vista, que podem ser solicitados a qualquer momento.
Os bancos de desenvolvimento são instituições controladas pelos governos estaduais e têm como objetivo o financiamento de projetos com impacto no desenvolvimento social e econômico local, captando depósitos a prazo. Os bancos de investimento, por sua vez, dão suporte às empresas em operações mais complexas, como fusões, aquisições e abertura de capital na bolsa de valores, além de ofertarem financiamento de longo prazo para as companhias.
As cooperativas de crédito oferecem serviços similares aos dos bancos, entre eles os empréstimos e financiamentos. A diferença é que esse modelo opera sob a lógica associativista. Dados do Banco Central mostram que o Sistema de Crédito Cooperativo representa cerca de 6,5% do saldo total de crédito e está presente em 55% dos municípios brasileiros.
Já as instituições não bancárias, ainda sob o guarda-chuva do SFN, englobam instituições impedidas de receber depósitos e que, através de outras fontes de recursos, também realizam operações de crédito. As mais conhecidas são as Sociedades de Crédito, Financiamento e Investimento (SCFI), mais conhecidas como “financeiras”. As agências de fomento, por sua vez, têm função parecida com os bancos de desenvolvimento, voltadas para o provimento de capital fixo e de giro de negócios locais.
Embora essas sejam as opções mais comuns para quem busca crédito, também existem possibilidades fora do Sistema Financeiro Nacional. Um exemplo conhecido no mercado brasileiro são as empresas de fomento mercantil – também chamadas de “factoring” –, que adquirem as carteiras de valores a receber de outras empresas, antecipando esses recursos mediante a cobrança de juros.
Mais recentemente, surgiram novos modelos de concessão fora do sistema financeiro, como é o caso da Empresa Simples de Crédito (ESC), criada em 2019. Esse tipo de empresa pode ser constituída de forma individual ou em sociedade para realizar operações de crédito exclusivamente a microempreendedores individuais e micro e pequenas empresas que atuem nas proximidades da sede da ESC. A principal restrição ao seu funcionamento é que essas operações só podem ser feitas com capital próprio. Outro modelo recente são as plataformas “peer-to-peer”, que conectam investidores a empresas que precisam de recursos.
Para os próximos anos, a tendência é de que cresça no mercado brasileiro a presença dos Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios, os FDICs, regulamentados pela Comissão de Valores Mobiliários. Esses fundos compram títulos que representam valores a receber de empresas de diversos setores, antecipando o fluxo de recebimentos com um desconto. Antes acessível apenas a investidores qualificados, essa opção de investimento foi estendida aos investidores de varejo, tornando os recursos desses fundos mais acessíveis.
Por fim, existe o crédito fornecido diretamente por empresas a seus clientes. Essas relações são comuns entre fornecedores da indústria e varejistas. Já na relação com os consumidores finais, pequenos varejistas ainda fazem o parcelamento direto de suas vendas, enquanto a tendência entre as grandes redes varejistas tem sido criar a própria financeira. Nesses casos, é fundamental o estabelecimento de uma política de crédito que estabeleça limites para as operações e critérios de concessão, como é praxe no sistema financeiro.
É salutar que o mercado ofereça cada vez mais opções de crédito a consumidores e empresas, tendo em vista o seu potencial de estímulo econômico. A avaliação dos birôs é de que, mesmo com os avanços recentes, ainda há espaço para o mercado de crédito crescer no Brasil, alcançando patamares internacionais. Em todo caso, porém, dentro e fora do sistema financeiro, a análise de crédito deve preceder a concessão, sob risco do crédito mal avaliado comprometer a saúde dos negócios.
Obrigado pela leitura! Acesse outros conteúdos na página da ANBC.
Por: Elias Sfeir Presidente da ANBC & Membro do Conselho Climático da Cidade de São Paulo & Conselheiro Certificado