No último artigo, apresentei uma retrospectiva do que foi o ano de 2022 para o mercado de crédito. Em termos conjunturais, o saldo de crédito seguiu crescendo, sobretudo no segmento de pessoas físicas. Já em termos estruturais, o ano mostrou que as mudanças na forma de consumir os serviços financeiros sobreviveram ao fim do longo período de isolamento social e vieram para ficar. Olhando para frente, o que esperar de 2023?
Comecemos pela conjuntura. Diante da inflação e da elevação das taxas de juros, o mundo caminha para uma desaceleração da atividade econômica. No Brasil, as projeções de crescimento para 2023 são ainda bastante modestas, em torno de 0,75%, de acordo com o Boletim Focus, do Banco Central. Cabe a ponderação de que ainda é muito cedo e que os rumos da política econômica ainda ficarão mais claros.
No mercado de crédito, mesmo com o baixo crescimento projetado para o PIB, existe a expectativa de que o saldo de operações de empréstimos e financiamentos continue avançando a taxas elevadas. De acordo com a Pesquisa de Economia Bancária e Expectativas, da FEBRABAN, o saldo da carteira de crédito do sistema financeiro nacional deverá crescer 8,4% em 2023, mantendo um avanço mais intenso no crédito a pessoas físicas (10,4% na carteira de crédito livre para PF, ante 9,3% da carteira de crédito livre para PJ).
O levantamento da entidade também mostra que 88,9% das instituições acreditam que a inadimplência seguirá crescendo no próximo ano e apenas 11,1% apostam que os atrasos permanecerão no patamar atual. Antecipamos neste espaço o risco de a inadimplência subir ao longo de 2022. O próximo ano será a vez de endereçar essa questão. Os números dos birôs apontam para recordes de negativados no país, superando 68 milhões de brasileiros.
Diante do repique da inadimplência, a renegociação é um dos caminhos dentro das regras de mercado. Os birôs têm promovido os Feirões Limpa Nome, com o intuito de aproximar credores e consumidores. Além disso, disponibilizam plataformas ao longo de todo o ano para facilitar as negociações, permitindo que os consumidores possam retomar o controle financeiro e superar a restrição de crédito.
A julgar pelas projeções mais recentes, o custo do crédito seguirá elevado no próximo ano: o Boletim Focus prevê que a taxa básica de juros na economia deverá seguir na casa dos dois dígitos, encerrando 2023 a 11,75% ao ano. Essa taxa é menor do que a atual, mas ainda bastante expressiva, exigindo cautela dos consumidores ao contratar financiamentos e empréstimos. Na hora da renegociação, além de demonstrar o interesse em se livrar das dívidas, é preciso saber avaliar as condições do acordo, incluindo os custos da operação e a capacidade de absorver as parcelas renegociadas no orçamento.
Os condicionantes conjunturais do crédito são importantes, mas o setor tem vivido transformações estruturais que deverão impactar o seu desempenho. A taxa básica de juros foi colocada em um patamar elevado para combater a inflação, mas alguns instrumentos recentes podem reduzir os juros na ponta, sobretudo para os consumidores com um bom histórico de crédito. Um estudo do Banco Central mostrou que já se nota diferença nas taxas de juros cobradas de consumidores com informações do Cadastro Positivo disponíveis para consulta e os consumidores que não têm essa informação disponível. A tendência é que esse efeito se aprofunde.
Por fim, cabe dizer que as transformações do mercado de crédito continuam. Na pauta dos próximos meses está o marco de garantias, que tramita no Senado. O objetivo é tornar o processo de recuperação de crédito menos moroso por meio da criação de instituições encarregadas de avaliar bens dados em garantia e permitir que um mesmo bem seja usado para garantir mais de uma operação.
Em 2023, os birôs de crédito seguirão olhando para dentro, na busca de aperfeiçoar os seus modelos e aumentar a relevância da avaliação de crédito. E, como ocorreu ao longo dos últimos anos, também serão atuantes para fora, participando ativamente do debate sobre a modernização do mercado de crédito e a inclusão financeira no país.
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Por: Elias Sfeir Presidente da ANBC & Membro do Conselho Climático da Cidade de São Paulo & Conselheiro Certificado