Um dos desafios decorrentes da pandemia causada pelo novo coronavírus é o de mitigar seu impacto sobre a economia e o crédito, respeitando as condições de saúde e bem-estar. Assim, já foram aprovadas ou estão em aprovação no Brasil e no mundo inúmeras medidas emergenciais de suporte financeiro a trabalhadores informais, pessoas físicas e jurídicas que perderam ou tiveram expressiva redução em suas fontes de renda.
Internacionalmente, agências reguladoras e entidades do mercado de crédito recomendam a adoção de políticas de renegociação de dívidas, postergação de datas de vencimento de obrigações e flexibilidade nas negociações entre credores e devedores. Isso porque, ao estabelecer novas condições para a quitação das dívidas, evita-se o inadimplemento e atende-se a necessidades de ambas as partes.
Ao mesmo tempo, as principais autoridades de crédito no mundo reforçam a importância da integridade e continuidade dos bancos de dados de proteção ao crédito, por seu papel crítico para o funcionamento do sistema de crédito. Recomendam que os credores continuem a fornecer aos birôs as informações de inadimplemento e adimplemento, apesar da crise, tendo em vista que a continuidade do sistema é essencial para consumidores, concedentes de crédito e economia.
Na visão dessas entidades, a solução mais efetiva para proteger o consumidor é ampliar o crédito às empresas, principalmente às pequenas e médias, e aumentar o prazo de pagamento das dívidas de consumidores. E a manutenção do sistema dos birôs é essencial para qualquer medida de recuperação, especialmente como parâmetro para eventual programa de reativação econômica e auxílio a devedores.
O International Committee on Credit Reporting (ICCR), órgão do Banco Mundial, avalia que uma crise como a atual coloca em primeiro plano a discussão sobre como os pagamentos perdidos ou atrasados em decorrência da pandemia podem ser tratados no sistema de relatório de crédito.
Do ponto de vista do ICCR, as autoridades reguladoras dos sistemas de relatórios de crédito devem considerar a implementação de várias medidas. Entre elas, o compartilhamento completo e contínuo de informações de crédito, incluindo o relato de dados de pagamentos perdidos devido à crise, com as salvaguardas necessárias para terem efeito ponderado no histórico e na pontuação de crédito dos titulares dos dados.
A Associação de Fornecedores de Informação de Crédito ao Consumidor (ACCIS), entidade internacional que reúne 39 birôs de crédito, alerta para o fato de que as agências de notação de crédito não fornecem crédito e, portanto, não podem suspender pagamentos, pois seu papel principal é contribuir para o acesso responsável ao crédito e para a estabilidade financeira que protege mutuários, credores e a sociedade como um todo.
Nos Estados Unidos, o Conselho de Governadores do Federal Reserve System (FRB) e outras entidades do setor de crédito emitiram uma declaração interagências mostrando que essa situação única pode representar interrupções temporárias nos negócios e desafios que afetam bancos, cooperativas de crédito, empresas, mutuários e economia. O documento incentiva as instituições financeiras a trabalhar com prudência junto aos mutuários que podem não ser capazes de cumprir suas obrigações contratuais de pagamento devido aos efeitos da COVID-19. E consideram que ações proativas das instituições para reduzir o risco de crédito são do maior interesse de instituições, mutuários e economia.
No Brasil, a Associação Nacional dos Bureaus de Crédito (ANBC) e seus associados têm estimulado os indivíduos e empresas impactados pela crise a negociar com seus credores. O setor também ampliou de 10 para 45 dias o prazo para inserção de dados no cadastro negativo. Essa medida, ativa desde 17 de abril, vale por 90 dias e foi decidida em acordo com entidades de provedores de dados, como as instituições financeiras, para abrir espaço de renegociação entre as partes, sem penalizar consumidores e empresas.
Sendo o crédito um dos principais pilares de retomada da economia, é imperativo que o Brasil siga o princípio de integridade dos dados necessários para análise de risco de crédito, promova a interação entre as partes e marque as informações sobre tomadores de crédito afetados no contexto da pandemia para que recebam uma avaliação justa no futuro.
Qualquer iniciativa que limite o acesso ou uso das informações necessárias para a avaliação de risco de crédito trará incerteza aos agentes de crédito e, como consequência, a redução do volume de recursos e condições desfavoráveis na concessão de crédito, comprometendo as iniciativas do governo e prejudicando os consumidores, as empresas, a economia e o bem-estar do país.
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Por: Elias Sfeir Presidente da ANBC & Membro do Conselho Climático da Cidade de São Paulo & Conselheiro Certificado