Fonte: https://valor.globo.com/ – Por Jacilio Saraiva
Para garantir negócios em crescimento, o agronegócio não vai precisar apenas de boas condições climáticas e safras potentes. “As fazendas necessitam, cada vez mais, de conectividade, para integrar máquinas e rotinas de trabalho”, disse Paola Campiello, presidente da ConectarAgro – associação de empresas que visa estimular a expansão do acesso à internet em regiões agrícolas -, durante um dos eventos do Futurecom 2025. Entre 2023 e 2024, a cobertura de internet móvel em áreas rurais do Brasil passou de 18,7% para 33,9%, segundo o Indicador de Conectividade Rural (ICR), desenvolvido pela entidade, em parceria com a Universidade Federal de Viçosa (UFV). O ICR utiliza dados públicos de cobertura das operadoras e da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) para medir a presença de redes móveis 4G e 5G no agronegócio.
“O agro conectado é mais sustentável”, disse Campiello, destacando que a área conectada no país ainda é muito pequena. Com a análise de dados capturados nas propriedades com tecnologias como sensores e sistemas de internet das coisas (IoT), é possível saber a hora certa de plantar, colher e pulverizar as culturas, argumentou. A IoT conecta sensores, máquinas, drones e sistemas de gestão, formando uma rede capaz de coletar e analisar informações em tempo real. Com isso, o produtor pode monitorar o solo e o clima, ajustar a irrigação, otimizar o uso de tratores e colheitadeiras, cortando custos e desperdícios, acrescentou. A executiva, que também é gerente de novos negócios na multinacional de equipamentos agrícolas CNH Industrial, disse que o potencial de redução de despesas e do uso de insumos que a conectividade no campo pode promover já está comprovado no Brasil. Campiello citou o exemplo de uma fazenda “conectada” em Água Boa (MT), com três mil hectares de área cultivável. Com uma produção total de 12,9 mil toneladas, a safra 22/23 da propriedade foi 18% mais produtiva do que a safra anterior, detalha.
Comparando com outra fazenda sem internet, na mesma região, a conectividade permitiu uma alta de 3,5% da produtividade, resultando em 2,3 sacas de soja a mais por hectare. De acordo com informações da Case IH, marca da CNH, e da operadora TIM, responsáveis pelo projeto, estima-se que com um investimento de R$ 1,4 milhão, que inclui antenas, manutenção, kit de telemetria para as máquinas e consultoria, a operação pode ter o retorno financeiro do investimento em um ano e meio. Mas não basta oferecer inovações para o agricultor, ponderou Campiello. “É preciso levar letramento sobre as tecnologias e engajar a mão de obra”, disse. “Os funcionários das fazendas precisam saber por que todos esses sistemas estão lá.” Daniel Fuchs, vice-presidente de future growth da Datora, de soluções de conectividade, lembrou que a maior parte dos médios e grandes produtores não mora no campo e fica sem saber o que está acontecendo da porteira para dentro. “Com sistemas que fornecem dados na palma da mão, é possível checar até a velocidade dos tratores ou se há uma má distribuição de insumos nas plantações”, relatou. É essencial investir em capacitação, pondera. “Não adianta comprar redes de IoT se o dono das terras não sabe o que fazer com os dados obtidos pelos sensores.”
Na avaliação de Elias Sfeir, presidente da Associação dos Bureaus de Crédito (ANBC), os produtores rurais que conseguem explorar as informações capturadas pelas novas tecnologias podem garantir empréstimos com mais facilidade. Os bureaus de crédito são empresas que armazenam os dados financeiros de pessoas físicas e jurídicas, registrados pelo Banco Central (BC).
“Crédito não é um direito. É uma concessão e precisa ser conquistada”, destacou Sfeir. A análise de risco para a oferta de recursos cobre toda a operação rural, do fluxo de caixa ao tipo de plantio, explica. “Com mais dados disponíveis sobre as operações, podemos saber se a safra vai ‘sair’ mesmo e se os compromissos de crédito serão honrados.” O presidente da ANBC disse que está em gestação uma parceria de compartilhamento de dados com o BC e o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) com o objetivo de expandir a autorização a financiamentos para pequenos e médios produtores. “Cerca de 44% dos agricultores no Brasil não possuem um trator e 80% não têm acesso a crédito”, afirmou. Fuchs, da Datora, lembrou que a obtenção de empréstimos tem que ser “mais fácil” para o agricultor – tanto para comprar novas tecnologias como no apoio às demandas diárias das lavouras. “Uma caixa de transmissão de uma máquina agrícola, que geralmente é trocada a cada 18 meses, pode custar R$ 300 mil.”